Sinais contraditórios


Às vezes vivemos um conflito turtuoso entre o que sentimos e o que pensamos. Não há receita para resolver isto. Mas acho que devemos descobrir de “onde” vem realmente esse conflito – quer a vontade do sentimento, quer o sentido da razão. E devemos procurar formas de nos protegermos, mesmo que para isso tenhamos de fazer o que nos dói mais. Mas é tremendo não saber aquilo que realmente o nosso “eu” quer. Porque o nosso “eu” quer coisas distintas, quer mas não quer, quer assim e quer assado, gera ele próprio o conflito.

E pior quando os outros alimentam o conflito, e nos dizem também “quero mas não quero”. Expressões óbvias de desejo, de ternura, de vontade, seguidas de fugas, à criação de uma esfera de intimidade não física, de outros momentos, ou um travão accionado não se percebe de onde, que nos afasta de repente. Isto causa desgosto, deixa ressentimentos, curto-circuita a nossa alma, e grita-nos que nos protejamos.

Sempre acreditei que era destino, que estava escrito. Só que num daqueles romances de três quilos em que os protagonistas se desencontram em mais de metade do livro, mas que acabam a viver felizes para sempre – quem sabe a subir e descer o mesmo rio, num mundo à parte, no fim do tempo. Pois é – conto de fadas, de Princesa Encantada...

É verdade: queria ser “Princesa”, queria ser especial. E sim, aceitar que não sou “Princesa” ou especial, que não é a mágica do Amor, de certa forma, ameaça a minha integridade. Por isso é que acredito que tenho o direito de não aceitar este caminho. Tenho de me dar o mérito de saber ser eu a não escolher a estrada, mesmo que custe tanto, para me preservar e não abdicar do que é fundamental, essência, caroço de mim. Um dia serei Princesa Encantada. Por agora, continuo desencantada, mas Princesa, ainda assim, Princesa.

Não posso “desapaixonar-me” por artes mágicas – a mágica só funciona num sentido. Mas não posso continuar a tentar advinhar respostas, a decifrar sinais. Não posso mudar o tempo dele, não posso resolver-lhe os conflitos. E se é apenas químico-física, estou fora. Não é por aí que quero ir, nem com ele nem com ninguém, porque não acredito que possa ser sustento de nada sólido e duradouro. Seja o que fôr e como fôr, não é dele o mesmo que é de mim. Assim, não vale a pena arriscar. E alguém me pergunta: “ e se afinal estiveres a ler os sinais errados?”. E lá fico com pano para mangas para mais uma insónia, provavelmente o próximo post.

Fico a pensar se serei suficientemente forte para tirar do pensamento e do sentimento o que já resolvi tirar da vida, se sou suficientemente forte para não olhar para trás. Para fazer o corte limpo, estancar a hemorragia, desinfectar a ferida e fechá-la. Já decidi que ele não é o caminho, mas ainda estou a vê-lo, ao caminho, num raio duma tentação difícil, sobretudo porque ele lá pôs tanto sinal, que eu vejo contraditório. Tento ignorar os sinais e tento encontrar em mim mesma a direcção a seguir. Mas fico pendurada na incerteza da resposta a dar à pergunta desse alguém. Talvez ainda uma vã esperança de que alguma coisa fará os sinais fazerem sentido de repente, e que de alguma forma ele ainda me me pode ir buscar à encruzilhada.

Mas pergunto-me também - quererei ir com ele se assim fôr? Até que ponto conta mais o que se intenciona do que o que se percebe? Até que ponto podemos racionalizar o que sentimos, em face da lógica do outro, que mesmo que explicada, não é a nossa?

E estou cansada, estou farta de voltar atrás, sempre na promessa velada da clarificação a encher-me de certezas inúteis, e depois encontrar a mesma incerteza absoluta de sempre, a ficar cada vez mais baralhada, mais perdida, mais sofrida. Não vale mesmo.

6 comentários:

mf disse...

Sabes... Eu já passei por aqui... E foi por ver que a incerteza era sempre a mesma que acabei por mudar. Ter alguém que chama as coisas pelos nomes também ajuda.
Há gajos que se alimentam de nós, que gostam de nos ter por perto, como se fôssemos um porto de abrigo para onde sabem que podem voltar. E que sabem como alimentar o nosso sonho, dando sinais que nos fazem perder outra vez o rumo, porque nos fascinam com o sonho de que somos princesas para eles.

Mas no fundo, sabes... Eles não gostam de nós. Gostam da sensação de segurança que é ter-nos por perto. O que sentimos não é importante, o que importa é o que lhes damos. E este comportamento, minha querida, não é amor. É egoísmo.
Se um gajo te faz mal uma e outra vez e gosta de te deixar no limbo, chegando-se e afastando-se, pensa bem. Ele cuida de ti? Interessa-se, de facto, pelo que tu sentes, sonhas e queres? Ou não?

No meio da fantasia da nossa cabeça, há que racionalizar, sim. Chamar as coisas pelos nomes. Procurar ouvir a opinião de quem te rodeia e pode ter outra visão dele, que não aquela cheia de flores que o teu coração quer, mas a tua cabeça não.

A essência do amor é partilhar, é cuidar, independentemente das definições que criamos. Quem não o faz não ama. Por muito que custe, às vezes temos de aceitar isso...
É que há sapos que parecem mesmo príncipes...

CB disse...

mf, muito obrigada, mesmo, pelo teu comentário. A questão aqui é complexa porque ele não é esse típico caso a que te referes. Disso tive tal e qual com um homem que, ironicamente, acabou por ser o meu primeiro marido, e que me fez mais mal do que qualquer outra pessoa neste mundo, e não me queria largar quando eu quis partir.
O caso agora não é bem assim. Talvez de uma forma pior, ele nunca me fez promessas. E sabes – eu tento dar sempre aos outros o benefício da dúvida, e por isso talvez me atormente tanto a tentar decifrar sinais. Já fiz os meus erros na vida, sei que também já dei aos outros sinais contraditórios, porque por vezes me fecho demasiado em mim, e quando me sinto ameaçada sou exímia a esconder os meus sentimentos mais fortes atrás de uma expressão seráfica, “um sorriso de Mona Lisa”, como diz a minha melhor amiga. Tenho os meus fantasmas e eles às vezes gritam dentro de mim e fazem-me assim. Fiz isso também com ele a partir do momento em que me assustei. Acredito que isso também o terá confundido.
Só que eu, a tremer de coragem, estive disposta a ultrapassar isso, estive disposta a investir na criação de um espaço entre nós que permitisse, com o tempo, ganhar a intimidade não-física de que falo, e depois, quem sabe? Mas ele confunde-me ao aproximar-se e depois recuar. Dele só vejo com clareza a parte física, e a essa sou eu agora que ponho um travão. Sinto lá mais qualquer coisa, que pode ou não ser Amor, mas que ele também não está disposto a revelar, ou assumir, ou explorar. Sinto-lhe medos e incertezas e, estranhamente, um certo respeito. Ele também tem direito aos seus fantasmas... Para mim, o caminho para resolver isto não é físico. Para ele, tanto parece que não há problema, não há nada, como parece que há algo forte mas, à minha vista, essencialmente físico. E aqui nos desencontramos. Não faço sentido nenhum, não é?...
Certo, certo, é que, como escrevi aqui, ele até pode lá ter Amor, mas eu não o vejo, não o sinto e, mesmo que ele me dissesse “isto para mim é Amor”, para mim não é. Foi daqui que depois parti para a escrita do post seguinte. Que me custou a arrancar mas que me encheu de força.
E tens tanta, tanta razão em especial em duas coisas que escreves: ele não se interessa realmente pelo que eu sinto, sonho e quero porque não faz nenhum esforço para chegar cá dentro. E a outra: há sapos que parecem mesmo príncipes, ao que eu acrescento que o pior não são os que andam obviamente apenas à caça dos beijos, o pior são os que não querem ser príncipes, podendo.
Amanhã será melhor. Gostei muito do teu comentário. Obrigada. :)

Ana GG disse...

Desculpa a invasão!

Queria apenas dizer-te...como te compreendo, as tuas, poderiam neste momento ser palavras minhas.

CB disse...

Ana GG - qual invasão?! És muito bem vinda. E sabes? Descobri recentemente (e que pena ser tão tarde na vida...) que carregamos dores e sofrimentos que muito mais gente do que pensamos entende. O difícil é encontrar essas pessoas. Mas quando se encontram, descobri que só por isso nos sentimos um pouco menos sós, ou um pouco menos doidos às vezes. E também aprendi que partilhar esses sofrimentos ajuda-nos sempre a encontrar novos caminhos, direcções... O mais importante é continuar a acreditar. É muito difícil, mas... Volta sempre! :)

Apple disse...

Cara Princesa, ler-te está a ser uma descoberta e, ao mesmo tempo , um encontro comigo...tanta afinidade nas tuas palavras...

Obrigada pela tua visita. És muito bem vinda. Eu fico cliente da tua destilaria.

Bj

CB disse...

Bem vinda Apple!
Obrigada pelo teu comentário. É o mesmo que eu senti ao ler o teu blog. Como escrevi antes, pelo menos sentir que alguém entende o que sentimos faz-nos menos sós, e menos doidos...
Já sou cliente anónima do teu blog, apenas nunca tinha comentado. E lá vou continuar a visitar-te! :)