Geometrias

Do que mais sinto falta, nas ausências do meu filho, é da desculpa razoável para gastar o tempo em coisas deliciosamente simples, inócuas, leves. Descomplica. Torna esses bocados de vida lineares e torna-me a mim redonda, círculo perfeito, mas preenchido. É a forma dos momentos felizes. Sei já viver sem ele nas minhas semanas de Mulher alternadas, mas nunca sou tão redonda como nos dias de Mãe. E quando falham outras coisas, é nesse reduto que ainda procuro significar-me. Nunca mais serei independente, porque o meu círculo não se completa sem ele.

Na necessidade, prova-se a amizade

E hoje, no meio de um desespero, provou-se de uma forma autêntica, tão genuina e generosa, que me embargou até as linhas escritas. Irei dormir um pouco mais em paz, espero que hoje também um pouco mais cedo, e não sei a quê ou quem agradecer a benção de uma amizade assim, que de repente me tirou do fundo do poço, fundo-fundo, escuro-escuro; e me deu uma mão para ver a luz um pouco melhor: perto-perto, claro-claro. Obrigada.

Lição do momento

Se a vida não servir para alguma coisa, deixa de ter sentido. E há poucas coisas piores do que cruzar os dias do calendário sem razão, sem sentido. Por isso, e também porque em geral torna mais fácil progredir, procuram-se razões. Procuram-se, quanto mais não seja, tirar lições de vida. Quando alguma coisa corre mal, sobretudo, é preciso justificar tamanha aberração, como se a vida fosse suposto ser um percurso tranquilo e nós fossemos (porque temos de ser) merecedores apenas de coisas boas. E então justifica-se o desvio com vários chavões, desde o que declara que tudo tem uma razão de ser (como se algum desígnio superior nos controlasse a vida e, ainda, soubesse bem  o que anda a fazer), ao que advoga que as dificuldades e o sofrimento nos tornam mais fortes (enorme alarvidade, e não sou só eu que digo, diz também Sándor Márai: "Não é verdade que o sofrimento nos purifica, nos faz melhores, mais sábios e compreensivos. Nós nos tornamos frios, iniciados e indiferentes."), até ao que prenuncia que quando se fecha uma porta se abre uma janela (só esquecendo que, às vezes, essa janela pode não dar mais do que direito a um tombo de um 18º andar). 

Já não acredito na obrigatoriedade da felicidade, não acredito que o que vivemos faça parte de um plano maquiavélico (para não dizer diabólico) sobre o qual não temos controlo mas que nos encaminha, imperceptivelmente, para um final feliz. Acredito na citação do Conrad que já aqui algures para trás usei: "tudo o que a vida nos pode dar é um certo conhecimento dela que, normalmente, chega demasiado tarde".      

Mas quando atravesso momentos desses em que não vejo sentido para o que estou a viver, em que me sinto injustiçada pelo destino porque me considero merecedora de melhor sorte, não consigo deixar de me render a um outro chavão: vivendo e aprendendo. Irrita-me cair eu própria nessas lógicas de que a vida tem de fazer sentido mas, realmente, é o que tento retirar de momentos destes - lições. E eu que sou pessoa de tragar o tempo, de não gostar de desconhecer o futuro, quase obsessiva nos planos e métodos em antecipação desse futuro, que gosto de estar preparada para tudo e saber bem por onde vou, porque me recuso admitir que não controlo o meu destino, tenho agora uma difícil lição para aprender à força, já que até esta idade não fui capaz de a aprender de maneira mais suave: um dia de cada vez, não adianta fazer grandes planos, entrega os pontos Princesa. E tenho de dar razão a Sándor Márai, pelo que sinto hoje em face disto, e no seguimento da citação acima que assim continua: "Quando compreendemos, pela primeira vez na vida, o destino, nos tornamos quase serenos. Serenos e solitários no mundo, de um modo singular e assustador." E isso porque o que se compreende do destino é que pode mesmo não nos reservar a sorte que queríamos; e a vida pode não fazer sentido nenhum, para além de justificar nos calendários a contagem dos dias em meses e estações, deixando cabelos brancos e rugas na pele em nós.

Sem marca registada

Pasmo-me sempre quando leio o mesmo que penso, que sinto - e que até escrevo, nas linhas de outros que nem sabem quem sou. Não sei porquê, e não sei se é igual com todos, mas ao mesmo tempo que gosto da identificação, ou me sinto bem por ver que alguém pensa e sente igual, (o que não faz de mim essa louca que às vezes penso que sou - e que alguns pensam que sou), o certo é que também me doi o orgulho, porque - afinal - não sou assim tão original. E eu até gosto de ser original. Mas é verdade que também pode ser um bocado solitário.  

No fundo, somos todos seres únicos, mas somos todos feitos do mesmo. Não há muito de original em cada um de nós, se não na forma de o expressar. Que há quem não saiba expressar, há quem não queira expressar, e há quem consiga passar a letras essas coisas mais profundas. Nada do que se escreva versando sobre alma e sentimentos, mais ou menos elevados, mais ou menos romanticizados, é produto original. É sempre reflexo do Homem, não pertence em exclusivo ao ser individual que o soube exprimir.  

Quieto!

Há passados que são para deixar quietos. Na verdade, se há passados que se entranham em nós e se repetem durante anos a fio, não nos acontecimentos, mas no que produzem em nós (na maneira de ser, nas decisões, nas procuras e nas fugas), lamentavelmente (ou não), também há os que terminam e não deixam lastro, os que cumprem uma função pontual e perfeitamente delimitada. Talvez deixem também alguma marca indelével que, muitas vezes, nem entendemos que está lá. Mas não caminham connosco, não se repetem ou replicam. Esses, é melhor mesmo que se deixem quietos para que, ao menos, ainda dêm umas boas histórias em momentos de viagem ao passado e para que consigamos perceber-lhes a função. O problema é que os passados de cada ser humano, inevitavelmente, são passados dos outros seres humanos que habitaram esse tempo, que cruzaram o mesmo caminho, que fizeram, connosco, essa história antiga. E acontece, por vezes, que para uns a história acabou mas para os outros não. E isso é um problema irresolúvel. É que não se faz história de novo com personagens a viver em tempos diferentes. Não se re-encontram no novo tempo, então melhor que não se re-encontrem no espaço, e que cada um prossiga a sua história. 

Distracções Fatais

Se há coisa que não se pode contornar, é o click, ou a falta dele. Podem chamar-lhe também atracção, química ou simplesmente tesão. Mas é impossível de ultrapassar. Ou há, ou não há, tão simples e definitivo quanto isso. Agora, logicamente também não ajuda um relato pormenorizado de uma qualquer maleita dermatológica oculta, assim sem mais nem menos, logo num dos primeiros encontros. E se já é mau ouvir tal confidência sem denotar na expressão o nojo que tal causa, de tal forma em esforço por não ouvir muito, para manter a compostura, que mal se fixa o nome da maleita, pior ainda se o recambolesco episódio se dá durante uma refeição. Mas uma senhora não desarma. Mal se come a partir desse momento, e o pouco que se mastiga é para dar folga ao músculos faciais (em total tensão para tentar manter o semblante inalterado com o esboço possível de sorriso), e evita-se muito contacto visual depois, para não vomitar logo ali. Cenas da minha vida que, não fora eu agnóstica, me levariam a exclamar um “Senhor, tende piedade!”, e a cumprir longa penitência para expiar os meus pecados, que são muitos, eu sei, mas nenhum também assim essa coisa toda que merecesse estas provações.

Another one bites the dust.

Desculpas

Sim, eu também preciso de desculpas, de justificações e atenuantes. Não gosto de errar, não assumo os meus defeitos e erros com vanglória. Assumo-os num processo auto-crítico fundamentalmente racional, assumo-os como consequência inevitável de não poder negar factos objectivos, e assumo-os condoidamente como resultado obrigatório de ter de me assumir imperfeita e falível, tantas vezes menor do que aquilo que quero ser. Também não os assumo por ser modesta, portanto, pois que a modéstia não se compatibiliza com os desejos de grandiosidade, perfeição e infalibilidade. Aceito a minha condição humana, o que quer dizer que me reconheço imperfeita e admito a inevitabilidade do erro mas, também, não me quero desculpabilizar com essa humana verdade e acho que devo, pelo contrário, penitenciar-me por isso e esforçar-me por errar menos, por ser cada dia melhor. Falho redondamente, é claro.

Também não escapo à humana tendência de procurar razões, de procurar porquês. Muitas vezes internos, mas outras tantas vezes externos. As tais atenuantes, para além da condição do erro da espécie, que acabam por não ser mais do que desculpabilizações. É que, se já custa pedir perdão aos outros, mais ainda custa pedi-lo a nós próprios. E quando penso e escrevo que aqui volto porque aqui está a minha raíz, na verdade o que aqui está é a minha desculpa. Estão as razões, externas, de porque me encontro neste caminho à deriva, a história do meu passado. E sei agora que volto porque sinto que falhei o prazo para encontrar o caminho, porque sinto que passou demasiado tempo para que possa continuar a usar essa história como razão-desculpa para não ter conseguido mais e melhor. Porque sei que, entretanto, se passou mais um bocado de história, um argumento onde não encontro justificação plausível, desculpa aceitável, para ter ficado parada na estrada. E cansada, muito cansada. Falta perdoar-me e falta, realmente, recomeçar.

Incentivo?

O meu filho, depois das conversas da outra semana, assim do nada, ao jantar:

Ele, tom paternalista - Mãe... um dia a Mãe tem de deixar algum senhor encontrar uma namorada.

Eu, perplexa - Como é que é isso??...

Ele, cabeça de lado - Sim, um dia... se algum senhor procurar uma namorada... e mais ninguém estiver à espera... assim a Mãe já pode ser uma namorada desse senhor!

Eu, a registar o raciocínio, não evito rir.

Ele, chegando-se a mim, em tom de advertência - Mas que tenha um nome bonito...


Depois fiquei com uma lista de nomes, pelo meio dos risos. E registo sobretudo o "se mais ninguém estiver à espera", o que faria de mim a última mulher à superfície da terra. Incentivo, really??

Compasso de espera

Parece que a curva é ascendente, e tenho uns dias para o confirmar, preparar a potencial descida, e eventualmente... enjoy the ride. Sei, eu sei: se me preparo demasiado para a potencial descida, não aproveito a subida. Mas também quanto mais alto se sobe, maior é a queda. Estou simplesmente expectante, mas pelo menos já não tão afundada.

E o que eu não sei é porque é que terei nascido com este ar tranquilo e sereno, quando, na verdade, das coisas que mais me custam são as esperas, as pausa, os hiatos de tempo que medeiam as coisas que acontecem realmente, brancos de tempo, de acção e sentido. Claro - tento distrair-me. Nem que seja com parvoíces. Qualquer coisa serve para não me ocupar demais com ausências, faltas ou vazios.

Sinusoidal

Assim foi o meu dia ontem: em 24 horas, o suceder de curvas desenhadas por altos e baixos, abruptos, extremos, inesperados e descontrolados. Curvas que deram lugar a picos, pela falta de tempo para apreciar as subidas e preparar as descidas. As sinusoidais são as curvas normais da minha vida e de mim, mas são geralmente atenuadas pela lentidão do decorrer do prazo, um pouco maior que um dia. Sinto que passei a última semana aos trambolhões e de ontem nem tive tempo de limpar o pó. Pior que só hoje, mais logo, vou finalmente perceber onde para afinal a curva. Mas o pó tenho que limpar, que seja como for continuo a andar.

Cansaço

Todos esperam que eu aguente. O meu próprio pai, um dia, confessou que não se preocupa muito comigo porque, diz ele, enquanto as minhas irmãs são mais frágeis, de formas diferentes mas as duas, melhor ou pior eu consigo sempre ultrapassar as dificuldades, sou quase sempre auto-suficiente a resolver os meus problemas, e não aparento precisar de apoio. Não é só ele. Quase todos à minha volta me atribúem uma "força", que não sabem explicar de onde vem nem porque vêm, mas parece que, ao estabelecer a sua existência, se sentem dispensados de ajudar, ao mesmo tempo que não me dispensam de aguentar e ultrapassar. Seja o que for, seja quantas vezes forem. E, no passado, depois de cada queda em que aterrei de pé, mas sozinha, com mazelas e passos incertos, nem sequer recolho grande admiração, porque não é senão o que esperam de mim.

E se um dia não aguento mesmo? Se um dia me falha essa força, que nem eu entendo de onde tem vindo ao longo da minha vida, e me deixo vencer? Se um dia não sou capaz de encarar mais um desaire na vida com aparente facilidade, e sem perder o sorriso, se um dia nem o meu filho me faz querer procurar em mim a garra de que preciso para não resvalar do precipício, se um dia me sinto esgotada, vazia, drenada e sozinha, nesse dia, para além de me derrotar a mim própria, sei que desiludo todos à minha volta e não sou capaz de pedir uma mão. Pode ser hoje. Pode ser agora.

Desabafo 2

Temos muitos males neste país, mas eu não posso deixar de eleger a falta de acesso e (pasme-se!) de justeza, do nosso sistema judicial como o mal maior. Um país onde recorrer à Justiça equivale a gastar um dinheirão em advogados e custas e ser vencido pelo tempo, pelo desgaste, pela incerteza da decisão moralmente justa, em vez de equivaler a obter (pasme-se novamente!) elementar justiça, é um país que incentiva o florescimento de aldrabões e vigaristas, que exploram a fraqueza do sistema para se aproveitarem das pessoas honestas. São estes aldrabões e vigaristas que, à sombra da morosidade dos processos, confortáveis com o empate do tempo porque avençam Advogados por meia dúzia de tostões (“meia dúzia” para eles, não para os honestos), e se escondem em todos os buracos da lei e do processo que conhecem de cor, enganam as pessoas honestas com total displiscência e à vontade, com uma revoltante facilidade, e ainda têm o descaramento, quando confrontados com as vigarices que fazem, de perguntar ironicamente a quem enganam se querem ir para os Tribunais. As pessoas vigarizadas neste país devem ser muitos milhares, todos os dias a engolir as injustiças que têm de aceitar, às vezes, por razão de sobrevivência, sem alternativa que não seja chorar as injustiças em privado, ou anonimamente.

O colo

Redondo, macio e aconchegante. Assim há de ser o colo. Casulo, onde possa ficar quieta, onde me possa embalar, fechar os olhos e deixar tudo passar. Para depois voltar à vida, com o corpo quente do mimo e a alma leve lançada, num sopro, como um pássaro que voa do ninho. Mas que volta, cada dia. Sou já ninho que assim cuida da cria, mas preciso ainda, tanto, de outro corpo, outras asas, outro mimo. Um colo não. O colo.

Dores de crocodilo


Se não há dor sem sentimento para ferir, então se dói é orgulho. Nova máxima a reter, para que não se confundam as coisas. Como as dores.


Nem sou muito fã de citações, mas…


“O maior prazer de uma mulher inteligente é bancar a idiota diante de um idiota que banca o inteligente.”

Como em todas as citações deste género, que por aí abundam agora sobretudo no Facebook, não é uma verdade absoluta e tem o seu quê de exagero. Não diria, por exemplo, que é “o maior prazer” - mas que dá gozo, isso sim.

Tal como muitas destas citações, também tenho (e acho que a maioria é igual) tendência para generalizar (de que é exemplo paradigmático esta mesma frase). Ninguém consegue realmente reflectir e escrever, por exemplo, sobre relacionamentos, sem cair na natural tendência de referir “os homens” e “as mulheres”. Mas claro que as generalizações são perigosas - até a estatística, científica e matemática, teve de conceder na criação dos conceitos de margem de erro e desvio padrão!

Não há grande mal numas generalizações que são, efectivamente, espelho da tendência da maioria, ou pelo menos reflexo da nossa própria experiência, desde que se mantenha em atenção que é apenas isso. Usar generalizações, muitas vezes citadas de autores que nem se creditam, com erros e descontextualizadas, e achar que são verdades absolutas que se podem usar para catalogar e condenar os outros, e até usá-las para insultar alguém, isso é que é doente. Se há grande verdade sobre o Homem, sobretudo no que diz respeito à alma e sentimentos, é que nada é absolutamente standard, definido ou definitivo. Tudo em nós é único, relativo e também mutável. Cada uma das nossas verdades tem um colorido muito próprio, e quem somos nós para julgar as verdades dos outros, ou pior - julgar os outros com base nas nossas verdades?

PS:
Já agora, assim na onda da generalização, e tendo já dito as coisas sérias, com uma margem de erro de para aí 0,00000001% e um desvio padrão tendencialmente zero: uma loira burra acha que todas as loiras são iguais e, como não se vê burra, acha todas inteligentes (a não ser que sejam mais giras). Uma loira inteligente, diverte-se à grande por causa das burras, loiras ou não, que acham que não são burras, e dos homens que, mesmo não sendo loiros, pensam como elas - as burras - e também se acham muito inteligentes. Uma loira inteligente faz de conta que não entende, ou então diz algum sarcasmo que os burros não percebem, e depois dá as melhores gargalhadas sozinha, no escurinho do cinema. Ou noutro sítio qualquer.

Lógica Masculina n+1 (em que n é o número do último post que escrevi sobre essa lógica, mas que já não me lembro qual foi, e não me apetece procurar, porque ainda não quero reler os meus textos vintage)

Com episódios recentes vários, acabo por chegar à conclusão que o meu teste de aferição de real interesse masculino era contraproducente. O teste qual era? Eu chamava-lhe “o choque”. Achava que se dissesse as piores coisas sobre mim, se me mostrasse muito complicada e inacessível, afugentaria os que não queriam nada de sério e restariam os que valiam a pena, os que estavam dispostos a lutar. Mas não, completamente errada! Agora percebi que, se um homem em vez de fugir ainda se galvaniza mais, o que isso significa é que está-se nas tintas para o que somos, fomos e seremos, porque o que ele quer mesmo sei eu! Os que têm, de facto, alguma intenção mais séria, esses é que pensam duas vezes se vale a pena investir numa mulher que se revela complicada e se pinta até de quase louquinha. Coisa simples…

Por outro lado, como me dizia um colega numa animada discussão de tempos mortos no escritório, um não de uma mulher com um sorriso, ou palavras equivalentes (que as mulheres acham de compaixão – “coitado, também não o quero deixar destroçado”), para os homens é simplesmente um “sim, entro no jogo, come and get me”. Dizia ele que se uma mulher não quer mesmo, deve apenas dizer não, sem explicações ou atenuantes, e não deve pensar que pode ferir os sentimentos dele, porque - palavras de homem - os homens não se apaixonam antes de se envolverem com uma mulher. Ou seja, traduz-se em que não há sentimentos nenhuns para ferir, apenas orgulho - e isso digo eu. Dizia ele, continuando, que às vezes acontece apaixonarem-se, mas só depois, por isso um não sem piedade ou compaixão numa abordagem inicial, não destroça homem nenhum. I’m soooooooooo shocked! Coisa complicada…

E na discussão do Dum-Dum, sequência do último post, a conclusão é que o melhor a fazer é absolutamente nada, mas tem de ser mesmo nada. Ou seja, o problema, o que alimenta os melgas e depois os torna emplastros, é atender nem que seja uma das 100 chamadas, e responder nem que seja a uma das 500 sms. A ideia de que se pode deixar ir a coisa morrendo, é absolutamente errada. O que quer dizer que "almoço" já foi asneira da grossa...

O Grande Melga

Não gosto, mas não gosto mesmo, de melgas. Já escrevi algures por aqui (mas também não gosto, não suporto mesmo, os “toca e foge”, e disso falo noutro dia em que esteja para aí virada). Esta coisa da melguice, no entanto, tem muito que se lhe diga e fez-me inclusive redefinir uma máxima que tinha e usava, convicta de que era um óptimo teste de aferição de interesse (mas isso também deixo para outro dia).

Ora, por partes: um homem que é melga é simplesmente um chato. Se não for o Herman, não se aguenta, ponto final. Este é o homem que insiste mesmo quando já dissemos de vinte maneiras diferentes que não estamos nem aí, a quem já recusamos vários convites, a quem não atendemos o telefone mais de metade das vezes, a quem não respondemos à maioria das sms, etc. Também há os persistentes e, convenhamos, sem um pouco de persistência realmente não vão a lado nenhum, porque mesmo que haja interesse do lado feminino, há geralmente um tempinho de espera obrigatório que é, nem mais nem menos, o primeiro teste que as mulheres fazem para perceber se eles querem “mesmo”. A linha é ténue, muito ténue, e hoje houve um dessa raça que, não obtendo resposta ao segundo convite para ir tomar um café, e não tendo obtido o meu número de telemóvel em troca do dele, resolve nada mais nada menos do que procurar o número do meu escritório na internet e ligar-me para o trabalho! O que ele não percebeu é que, se até aqui estava no respeitoso limbo da persistência, enquanto eu me decidia se queria ou não dar mais conversa para além do Facebook e dos ocasionais encontros acidentais por essa noite lisboeta, com esta habilidade passou para o campo dos melgas. Sobretudo quando, não contente por me ter feito passar uma vergonha no escritório, (que toda a gente percebeu o que se passou com aquele telefonema), não me dá hipótese e vai daí apanha-me à porta do escritório para almoçar... Agora tenho que pensar que Dum-Dum vou usar neste, antes que passe para a categoria dos emplastros, ou mesmo dos doidos varridos. 

Só me calham duques...

Não o poderia dizer melhor


Amar não é olhar um para o outro, é olhar juntos na mesma direcção.

Antoine de Saint-Exupéry

Nas curvas


Volta não volta, temos de pensar no que queremos da vida. Há umas curvas manhosas em todos os caminhos e a mim parece-me que, embora a tendência seja acelerar e fazê-las prego a fundo, nem que seja um bocadinho em contramão, armando-nos de valentia (ou será inconsciência?), a seguir convém travar e até, se necessário, encostar na berma e respirar. E depois pensar para onde vamos, para quando metermos de novo a primeira o podermos fazer com maior tranquilidade.

O que eu quero da minha vida é um mistério. A sério. Não é só a estrada e a próxima curva que me são desconhecidas. É mesmo o destino que eu ainda não consegui perceber onde quero marcar no mapa, que parece, em dias, que não é visível a um par de olhos apenas. Há dias em que acho que o que quero é viver tranquila, dedicando-me ao trabalho, desfrutando do meu filho quando posso, e aprendendo a encontrar uma definição qualquer de felicidade que possa rimar com sozinha, mas que não rime com solidão. Outros dias, acho que o quero é mesmo provar possível que nunca é tarde para encontrar o amor, e aprender a ser feliz com essa companhia, redefinindo a família que agora é só o meu filho, e perspectivando todo o resto que agora é só o que tenho, que me faz falta, me segura como tábua de salvação, mas que ainda assim é pouco, é parco, e sabe a insatisfação.

No fundo, eu tento, juro que tento, encontrar formas e razões para dissociar felicidade de amor. Posso escrever ensaios cheios de lógica, encher-me de razões, mas depois, fala mais alto aquele aperto, aquela pequena angústia relegada para um cantinho da alma, mas exactamente aquele canto que mais dói, que me questiona todos os dias se algum dia encontro, realmente, alguém que eu queira como companhia de viagem e que, mais que olhar para mim, queira olhar comigo para o mesmo destino, marcá-lo no mapa e, então, meter a primeira, sem saber o desenho das próximas curvas, mas sabendo bem para onde queremos ir.

Acho que, afinal, ainda estou para as curvas...

Desabafo 1

Não sei por que carga de água é que a minha vida teima em se repetir. Já cansa. Tenho a sensação de ser o próprio do burro naquela imagem em que o dito anda fixado na cenoura a um palmo de distância, e que na realidade nunca alcançará por mais que ande com determinação e vontade, porque quem segura a cenoura vai à boleia. É uma linda metáfora, sim senhora, mas na vida real não tem gracinha nenhuma. Se calhar, tenho de aprender a gostar de relva. Ou simplesmente prescindir da cenoura.



Será a cenoura o motivo certo de tanto esforço?

Contas da semana

Assim, por alto:

• Saldo social – no positivo, com o matar de saudades do meu filho e a constatação da disponibilidade de várias pessoas que ofereceram uma mão numa complicada semana; e ainda um aniversário pelo caminho onde deu para encontrar mais alguma família e outros amigos e passar um bom momento.
• Saldo profissional – indefinido, com um projecto em avaliação e ainda sem decisão final, numa semana de dois dias de imenso trabalho e três dias de olhar para as moscas, o que há muito que não acontecia e tem o perverso efeito de nos pôr a pensar demais noutras coisas e a passar tempo demais no chat do FaceBook.
• Saldo físico – algum cansaço, consequência de semana de mãe, e mais dos dias não-produtivos, que parece que cansam mais que os outros, e do stress da antecipação da aprovação do projecto que é crucial para o meu futuro. E mais: quem diz que ir ao ginásio dá energia, e soma a isso uma vida realmente ocupada, tem um problema grave qualquer!
• Saldo educativo - umas quantas lições importantes, como por exemplo: não mexer nas sobrancelhas nas horas subsequentes a ter um acidente com o carro e enquanto se visualiza o orçamento da reparação. O orçamento não reduz (mesmo) na proporção das sobrancelhas. Felizmente, elas crescem de novo, e o orçamento espera-se que não.
• Saldo bancário – obviamente: negativo.
• Saldo emocional – em desespero absoluto pelo fim de semana.

O Balanço, é como o prognóstico: só no fim do jogo, que ainda faltam dois dias.

Snapshots

Curtas do meu filho, somadas ao longos dos últimos dias, por ordem cronológica:

Assim do nada, ele:
- Quando eu for crescido vou correr de manhã. Quando a mãe acordar de manhã e não me vir – já sabe: é porque eu fui correr.
(Weird...)


- Uma amiga da Mãe disse-me que a Mãe tem um namorado.
- Mas a Mãe não tem nenhum namorado! Qual amiga?!
- Só não me disse o nome...
- Ninguém pode ter dito isso L, porque a Mãe não tem nenhum namorado. Mas gostava de ter.
- Para quê?
- Para me fazer companhia quando estou sozinha.
(Silêncio desconfiado e rápida mudança de assunto…)


- Quando é que eu vou ter um mano?
- Primeiro a mãe tem de encontrar um namorado!
- Não, não é nada! Porque o V teve um mano e a mãe dele não tem um namorado!
- Mas tem um marido, que é a mesma coisa.
(Pausa)
- E a mãe vai procurar um namorado?
- Sim, vou procurar.
- Mas não pode Mãe!! (realmente indignado...)
- Porquê??
- Porque as meninas não procuram namorados! Os rapazes é que têm de encontrar namoradas!
(WTF???)

- Mããiin?...
- Sim?
- Quando tivermos outro filho - e eu já tiver idade para ser mano…
- Ahahahahahahaha!
(era para dizer outra vez que ia correr de manhã… Go figure!…)




PS: Ninguém me faz rir da mesma maneira. Bless him...

Fora de época

Hoje chove. É estranho como esta chuva assim, miudinha e quente, estranhamente quente, me deixa sempre com uma sensação desagradável. Não lava - ensopa. Entranhando a sujidade que não leva. E fica-me este desconforto porque, às vezes, tenho a impressão de andar a fazer o mesmo, enquanto salpico, com a lógica e a dialéctica, as coisas que me vão dentro, para que arrefeçam e se aquietem. E os salpicos apenas acrescentam humidade à temperatura, numa mistura de cheiro a mofo e nevoeiro de tempo quente, ar salobro que mal se respira; salpicos que não me lavam a alma, porque o tempo continua quente e não é ainda o tempo daquela chuva forte, fria, de gotas grossas que hão de correr por mim num rio purificante e libertador. Não é ainda o tempo.

Passado repetido

Passa-se o tempo, passa por nós. Olhamos para trás e cada memória traz um sabor, um cheiro, uma cor. É aquilo que predomina, na selectividade inconsciente da memória que ficou. Depois pensamos: mas houve qualquer coisa. Talvez uma zanga, uma desilusão, uma mentira. Qualquer coisa haverá para que se culpe a distância que o tempo medido, nestes momentos, apenas comprova. Quando tudo falha, culpa-se a vida, essa malvada que sempre se põe a jeito para carregar com as culpas que não queremos (porque não há distância de vida que nos separe daqueles que amamos, incluindo os amigos). Olhando para trás, num esforço, acaba por se chegar lá. Lembro-me do que foi - foi assim, ou assado. Vagas cronologias de nebulosos acontecimentos. E o sabor, o cheiro e a cor, de repente ganham os travos, notas e nuances que nos sossegam a consciência - ou não. Mas afinal não é culpa da vida. Atribui-se a culpa e pronto, agora já se pode continuar. Pena é que, quando a vida proporciona um reencontro, alguns se mantenham presos nos acres do anterior fim, e não se foquem no doce da primeira instintiva, ainda que selectiva, memória, fazendo do antigo o novo, num recomeço. Triste perder amigos duas vezes. 

Sinais de esperança

O desencantamento que a vida, inevitavelmente nos traz, é também uma certa lucidez. É reconhecer que as coisas não são como sonhamos, como idealizamos, que a realidade do ser humano e da vida que levamos não se faz de argumentos bem montados e fluídos, nem tão pouco garante finais felizes.

O desencantamento leva a uma certa tristeza, como triste é o fim de cada sonho que se desfaz. Leva também, por vezes, a uma certa acidez, revolta pelo engano em que sentimos que vivemos antes. Leva quase sempre à desconfiança, porque não se quer ser enganado outra vez e, finalmente, à descrença, ao desalento, porque em algum ponto do caminho se perde a esperança.

E há momentos em que não sabemos já se os desconfiados, descrentes e desalentados que nos tornamos são o princípio ou o fim, causa ou consequência. Certo é que nos lançamos, a nós próprios, em círculos viciosos de que é difícil sair, quando nos proclamos esses epítetos. Mas de nada adianta perder tempo a tentar decifrar as causas de sermos o que somos. É como a velha discussão sobre o que veio primeiro – o ovo ou a galinha? Sejamos práticos: se o que temos na mão é o ovo, o que interessa é decidir como o cozinhamos. Se temos a galinha, interessa decidir se a comemos ou se tiramos dela um ovo por dia.

A lucidez do desencantamento devia abrir-nos a porta a um total redesenhar do mundo. Se o que vivemos não serviu para nos fazer felizes, há que encontrar outras formas de viver. Há que procurar alternativas, sem o estigma dos primeiros sonhos. Abandonar esses sonhos, ou ideais, realmente significa procurar sem querer o que antes se estipulou como necessário, mas também não é procurar o oposto. Talvez seja antes procurar a surpresa, mas, sobretudo, deixar que ela aconteça.

Vejo ao meu lado o desenrolar de um relacionamento que, no preconceito do que é amor e felicidade, não julgaria feliz. E estranho, confesso, que se possa amar alguém mas só estar apaixonado por esse alguém a dias, de vez em quando, em certos momentos. Mas quem sou eu para julgar? Certo é que quem vive esse relacionamento assim se sente bem, se sente em paz, e só tenho de admirar e aplaudir. Porque esse alguém, no fundo, fez exactamento o que queria ser eu própria capaz de fazer: aceitou um relacionamento que não é ideal, e fê-lo perfeito. Porque um ideal é só um abstracto direitinho, uma lógica, um raciocínio consequente. Perfeito é o que funciona. E desejo-lhes toda a felicidade do mundo.