Um Caminho no Céu

Começo a pensar que talvez tenha prevertido o papel do blog, ao criar uma clivagem ainda mais marcada entre o que sou e deixo aqui, e o que revelo lá fora. Com o tempo, fui-me convencendo cada vez mais que o meu mais profundo, e talvez o meu melhor, só pudessem ter eco aqui. Numa primeira fase, exposto ao mundo que me foi encontrando e que eu fui procurando, mas depois de paragens e recomeços, também aqui cada vez mais resguardado, protegido, solitário. No fundo, talvez me tenha convencido que o que sou mesmo por dentro não tem espaço de existir, em plano nenhum, senão mesmo por dentro. Mas ao mesmo tempo continuo a sentir necessário encontrar-lhe uma porta de saída. Talvez já não de entrada. Sim, talvez seja essa a diferença.

Estão por aí espelhados os meus paradoxos e idiossincrasias. Estão por aí expressos os meus dilemas, o  relato das minhas expressões mudas de Mona Lisa nos frente-a-frentes da vida, enquanto por dentro fervem as palavras que depois aqui param. Tenho total consciência de que continuo sem qualquer vontade, ou mesmo capacidade, para me expor olhos nos olhos, continuo a precisar dos meus véus, pese embora a solidão a que me condenam, e apesar de saber que são razão de incompreensão. Mas, acontecimentos recentes, levam-me também a pensar que, afinal, mesmo para quem não sabe que o que está debaixo do meu véu se pode ler aqui, passa na transparência algo mais do que pensava, e algo que os leva a querer mesmo levantar o véu, devagar.

Como alguém me dizia recentemente, deixamos um rasto. E é verdade: deixamos marcas da nossa passagem que são pistas para o que temos dentro. Um olho atento, interessado, chega lá sem ler palavras. É como o fumo branco de um avião que rasga o céu azul, que assinala a sua passagem e onde podemos discernir em que direcção passou. Alguns procurarão no horizonte, nessa direcção, saber-lhe a cor e a forma, interessam-se pela sua rota e destino. Outros não o farão. E afinal parece que há quem ache que o rasto que deixo na superfície do ar merece ser seguido. Afinal, deixo de mim um rasto que, não sendo tudo o que sou é de mim, e é caminho para quem realmente aqui quer chegar.


* Foto minha

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