Microcosmo

A perfeição não existe e sabemos que temos de viver com a imperfeição do mundo, com a nossa imperfeição e com a imperfeição dos outros. Sabemos que temos de viver no meio de tanto erro e desacerto, e aprendemos, embora a custo, a ceder, a conciliar e a perdoar. Algumas coisas mais a custo que outras, mas temos de ir fazendo esse caminho, sob pena de não sobrevivermos. O custo em si tanto pode ser engolir o orgulho, como chorar umas lágrimas de desilusão, desistir de alguma coisa a favor de um bem maior, ou arcar com um prejuízo financeiro a bem das boas relações. Entre tanto mais. No entanto, é difícil evitar uma reminiscência qualquer que nos quer fazer crêr que, no fim disto tudo, há um equilíbrio. Achamos sempre que o custo de uma concessão nos será compensado na vida pelo lucro da concessão de outro. Ou que as lágrimas que choramos nos serão compensadas por uma felicidade maior no futuro. Ou que os euros que imoralente pagamos por outros nos serão compensados pelo apreço do reconhecimento de termos sido honrados. Ou que o perdão que concedemos a alguém que nos feriu nos trará a paz da consciência (e o céu, já agora). Mas não, desenganemo-nos. Não há nenhuma ordem nem equilíbrio cósmicos no mundo. O certo é que cabe mais a uns que outros a quota do custo e - pior -  o mais certo é que haja sempre alguém que consegue somar-nos custos exorbitantes. Depois de suportar alguns, perdões, lágrimas e euros, chega um momento em que simplesmente achamos que "não merecemos mais". Lá está: na tal lógica do equilíbrio, da compensação a que ingenuamente nos achamos no direito. Mas esse momento chega, e chega mesmo, e quando chega faz-se pagar com juros, não só sobre o novo custo, mas também sobre todo o saldo acumulado. Saiam da frente, que alguém chegou a esse momento comigo e vou eu fazer pelas minhas mãos o equilíbrio micro-cósmico que mereço. 

2 comentários:

Anónimo disse...

Gostei da definição do texto. Abraço Cynthia

CB disse...

Cynthia,
Obrigada e bem vinda.
Abraço