"Destilar", cientificamente, é "separar componentes químicos que constituem uma substância através de vaporização seguida de condensação". Serve para muita coisa, nomeadamente, para produzir bebidas espirituosas. Aqui, é uma tentativa de purificação da mistura de tudo o que sinto, penso e vivo. A aguardente do que sou.
Os meus Gatos #2
O frio, as mantas e os dias tristes, fazem-me sempre recordar os meus gatos com mais saudade. Já escrevi sobre o primeiro, e hoje é tempo da história do segundo. Depois de ter perdido o Ludwig e decidir que não queria outro animal, o meu então ainda marido, um dia leva-me de surpresa a ver uma ninhada de persas para eu escolher um. Eu nem queria entrar, mas lá acabei por não resistir e fui sentar-me num canto. A ninhada era de quatro gatos, e ao fim de uns minutos tinha um cotumiço preto, de olhos côr de cobre e uma espécie de barba com as pontas brancas, a trepar-me pelas pernas e a brincar comigo. Se outra pessoa se aproximava, fugia logo. Levei-o para casa, pois...
Quando o larguei em casa, ele todo assustado, enfiou-se debaixo de um armário da casa de jantar e não saía dali nem por mais uma. Como não sabia do que ele gostava, pus à frente do armário uma série de pratinhos com várias iguarias. À noite, tinha amigos a jantar e a meio da refeição salta-me para o colo, depois de ter limpo os pratos todos, e a querer devorar tudo o que estava na mesa. Chamei-lhe Obelix...
Embora não fosse tão inteligente como o primeiro, era também meu, aliás, eu é que era dele, que ele é que me escolheu, e era muito carinhoso. Dormia sempre comigo, em cima dos meus pés, depois de um certo tempo de festas e ron-rons deitado na minha barriga. E isto foi depois de lhe ensinar que gatos não são bem gente, porque os primeiros dias queria dormir ao meu lado, com a cabeça na almofada e tudo.
Era cómico, mais brincalhão que o Ludwig, mas miava mais. Às vezes os miados dele pareciam sons humanos – sobretudo se levava um raspanete e o fechava longe de mim de castigo. É irreproduzível na escrita, mas era mesmo incrível. Parecia uma criança a choramingar, como quem diz “eu não fiz por mal, eu sou pequenino...”.
Este, perdi-o com o divórcio, cerca de um ano depois, uma vingançazinha mesquinha. Soube que o desgraçado do animal sentiu imenso a minha falta, caiu-lhe o pelo quase todo com uma coisa nervosa. Mas sei que recuperou. Eu é que ainda hoje tenho saudades dele.
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4 comentários:
Desculpa o comentário,mas isso é mesmo ser estúpido demais: tirou-te o gato? Bem... acredito que obicho tenha sofrido, segundo sei os animais também têm uma espécie de depressão nervosa quando são retirados, abruptamente do seu ambiente e uma das consequências é essa. E como tu muito bem dizes: os gatos não são nossos nós é que lhes pertencemos, ele é que nos escolhem.Bjs.
Catwoman,
De facto, mesquinhices. Tristes.
E sim - eles é que nos escolhem mesmo. :)
Bjs
Ocorre-me o padrão da típica história brutal, com um início suave, envolvente, com brincadeira, inocência e afectos a crescerem, para terminar em violência. Injustiça! Mas o mundo não é justo, às vezes para ninguém dos envolvidos. Revolta. Fica a homenagem com o teu excelente texto. E mais um episódio nostálgico para arrumar, o melhor que se conseguir.
fd,
É isso tudo sim. E está arrumado nessa gaveta das nostalgias. Só abro de ve em quando, para espreitar, e estas já não doem.
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