Nem de propósito, mas muito a propósito



"Que esta minha paz e este meu amado silêncio
Não iludam a ninguém (...)
Acho-me relativamente feliz,
Porque nada de exterior me acontece
Mas, em mim, na minha alma,
Pressinto que vou ter um terremoto."

(Mário Quintana, encontrado aqui)

A esta minha paz e silêncio ilusórios, a esta relativa e aparente felicidade morna, chamaram um dia "o meu sorriso de Mona Lisa". Tenho-o cristalizado por estes dias, enquanto procuro alguma coisa onde me agarrar, antes de ser sacudida pelo abalo interior que se avizinha, esse que pressinto, enquanto a tristeza melancólica das minhas ondas de maré vazia se vai transfigurando. E muitas coisas, tantas coisas, ganham para mim, nestas alturas, contornos diferentes. São dias de conjectura, de "e ses", para trás e para a frente, tentando talvez iludir a vida, como se, ao dissecar e re-equacionar os factos, as memórias, os  sentires, procurando formar com eles um padrão diferente, conseguisse um outro resultado final. Mas a equação não muda de significado se mantém os mesmos factores, mesmo que os ponderemos de forma diferente. E depois, por outro lado, há exercícios que não devemos fazer, há cenários que não se podem projectar, porque há factores, personagens, que não devemos pôr em cena, sob pena de nos termos de retirar. E um dia treme o chão, e podemos ver claramente o que não tem alicerce, e podemos ver claramente o que não abala, podemos ver-nos claramente o tutano. Enquanto esse dia não chega, resta a espera, por vezes em fuga.

4 comentários:

XR disse...

Cuidado, Princesa, cuidado...
Essa melancolia, esse vazar de maré prolongado na infinitude de um olhar apagado que se finge plácido... pode ser sinal de terramoto, sim, Princesa... tal como o sinal de um tsunami que se avizinha é o súbito escoar de toda a água, como que a maré mais vazante já vista, para recrudescer com inusitada violência apanhando toda a gente desprevenida.
E lembra-te, Princesa, lá porque não está lá ninguém para os testemunhar, não quer dizer que os tsunamis não aconteçam... só que por vezes, de alguns/certos tsunamis só se dá conta pelos salpicos que escorrem das janelas da alma, alguns palmos mais acima.

Cuidado, Princesa, não te deixes apanhar sem pé... prende a tua âncora às pequenas realidades que te preenchem os dias e te asseguram que apesar da maré vazante a praia existe.

Um abraço, grande grande

CB disse...

XR,
Obrigada pelas palavras, os alertas e o abraço. Sei que tens razão, sei a "lógica" das marés. Mas sei também que é maior o fundo do mar do que a praia; e as âncoras, por vezes, calham ser lançadas onde a areia não prende. E sim um dia tanto mar contido, larga-se terra adentro e é, geralmente, devastador. Mas neste momento, não sei se quero a praia, ou simplesmente perder o pé.
Um abraço também para ti.

Bípede Falante disse...

Nunca tinha pensado sobre se ter um sorriso de Monalisa.
bj

CB disse...

Bípede,
Eu achei uma expressão muito apropriada, de facto, mas nunca tinha pensado nisso antes de mo sugerirem.
Bj