Mercado sentimental

"You can't put a price tag on love", sim, mas... às vezes, sabemos que pode custar demais.

Geralmente, sabemos que apostar no amor pode custar umas angústias e umas lágrimas. Mesmo assim, o que de bom se viveu, ou se perspectiva viver, é quase sempre benefício suficiente para acharmos que vale a pena - que essas angústias e lágrimas são um preço justo por termos tentado. Como bem resume Antoine de Saint-Exupéry, autor que muito me diz, “A gente corre o risco de chorar um pouco quando se deixou cativar...”. E embora correr esse risco nem sempre seja fácil, é um risco aceitável para a maioria de nós. Já quando sabemos que esses hipotéticos bons momentos podem custar muito mais do que umas lágrimas - aí, tal como refiro no post anterior, a avaliação da relação custo-benefício torna-se duvidosa.

Como avaliá-la, por exemplo, se um eventual amor puder custar uma amizade? É que, em certas equações, para além do preço normal de nos apaixonarmos, ou de nos deixarmos cativar, a amizade, o carinho, o respeito de e por outra pessoa, mais do que um preço, tem um “valor”, resultado de um investimento que já se fez. E arriscar perder o retorno desse investimento, para apostar numa aventura às cegas que, podendo trazer uns bons momentos, nos pode também deixar sem amor e sem amizade, e com as lágrimas e mágoas do costume de parte a parte, parece-me – claramente -, um preço caro demais. Ou um benefício curto demais.

Diz que tudo depende da lisura do processo, da maturidade, inteligência e sensibilidade de ambas as partes. Talvez. Mas, se acredito que de um amor falhado pode resultar uma amizade, acho pouco provável que de uma amizade de que resulta um amor falhado, seja possível ressuscitar a amizade inicial. E, antes disso, a ideia de uma mágoa infligida a outro a quem queremos bem, ou a perspectiva de um ressentimento que nos fique desse alguém, é suficiente para obrigar a pensar pelos menos duas vezes antes de dar um primeiro passo. Acho que, neste mercado sentimental que gerimos sem licença, esta é a operação de maior risco que nos pode ser pedido que avaliemos. Para uma operação destas, mais que simples capital, pomos em jogo um dos patrimónios mais valiosos que temos: um amigo.

4 comentários:

Anónimo disse...

Mana ,
Posto assim, soa-me mais a coito interrompido.
Para mim, a amizade não é ameaça, é valor acrescentado.
Quantas relações sem predicados vindas do nada se esgotam no nada? Conheces-me , sabes que os meus amores crescem em mim, consolidam-se do que de melhor clono do outro e que acabo por devolver aos ramalhetes. A amizade vale por si como Amor. Se , por uma dobra atrevida do tempo, for apimentada por outros calores, que seja. E que seja muiiiito bom! Nada de errado nessa (re)descoberta.
Seria um mimo,- como nos derivados, de pensar em adquirir "futuros", e "opções" assegurando mínimos e máximos na carteira, Mas esse jogo não para aqui, esse preço- que não existe- não é transacção, é acordo- não é custo- é investimento.
E sendo ou não uma aposta segura, é bem mais desafio que um par de sapatos, ou não será? :-)

Anónimo disse...

mercado sentimental ou o sobe e desce dos nossos "produtos-eus", muitos. sobe e vai à alma desce e toca nos mínimos do coração. suporte e resistência. ou então a resistência como suporte.

CB disse...

Mana.......... Ui.

Ui, ui...

Tudo muito bem dito, mas... Isso do desafio e dos sapatos... Isso não vale!! :D

Mais a serio, sabes que, ao contrário de ti, nunca fiz esse trajecto mais gradual, sendo geralmente mais impulsiva, mais primaria, ate visceral nos meus gostos e desgostos. E custa-me pesar os pratos da balança assim.

PS: Desculpa a falta de alguns acentos, mas respondo via tfn e não consigo corrigir!

CB disse...

Anónimo,
Os nossos "produtos-eu" são muitos, sim, nem sempre os controlamos, e tantos nos glorificam como não nos dignificam. Mas não creio que a "resistência como suporte" seja uma boa solução. Soa-me um bocadinho como a avestruz que enterra a cabeça na areia. Mas gostei do comentário.