Bolhas

O sentido de auto-preservação é a primeira lei da natureza. Muito ao género do que chamei, lá muito (muito) atrás, o instinto de sobrevivência (engraçado reler este texto). É, de facto, incontornável a necessidade que temos de nos protegermos daquilo que nos faz mal, e inevitável também que, à luz da vivência que se vai tendo, deixemos ao comando do medo evitar “potenciais” situações de risco, mas também nem sempre sabendo identificar o risco - muitas vezes esquecendo que também "nos pomos a jeito" volta não volta. Na verdade, a auto-preservação é (mais do que um instinto), uma responsabilidade – no sentido em que, com maior ou menor sucesso, o ser humano deve caminhar na direcção da felicidade, do seu bem-estar, protegendo a sua integridade, tanto física como moral.

Mas, ninguém pode viver permanentemente num encapsulamento fictício que o afaste de todo o perigo; porque viver é perigoso, amar é perigoso, mas não querer expor-se a esses perigos resulta em não viver, em não amar. Resulta numa bolha de inércia e esterilidade que, perversamente, periga a própria sobrevivência.

Penso, até, que é por causa desse sentido de auto-preservação, de instintiva luta para nos salvarmos, que os obstáculos e dificuldades com que nos deparamos na vida, embora sejam em si “perigos”, são para nós elementos fundamentais de sobrevivência. De facto, além de nos ensinarem a reconhecer iguais perigos à frente, é essa luta por ultrapassá-los que nos impele a agir, a crescer, a melhorar, a realizar, concretizar. Muitas vezes, é a dificuldade do caminho que nos faz chegar ao destino. Pelo meio, claro, reconhecemos também fundamental, vital, acompanharmo-nos de outros, como os amigos. Mas, para fazer o caminho, precisamos tanto dos amigos e das ajudas, como dos inimigos e das dificuldades.

E no amor? No amor, as linhas são mais ténues, as fronteiras são mais permeáveis. É muito mais difícil perceber de que lado está o perigo, onde devemos refugiar-nos, a que destino queremos chegar. Podemos achar que vale tudo para alcançar o amor, e ficar pelo caminho num destroço, porque a busca nos destrói. E podemos, pelo contrário, achar que nos salvamos fugindo das lágrimas e das mágoas, para isso fugindo também do amor. Mas, nessa fuga, também nos selamos herméticos, estéreis, dentro de uma, afinal, muito frágil bolha de sabão.

São dúvidas senhores, são dúvidas…

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