Falta o dicionário

Não sei o que define o amor. Ocorrem-me as imagens daqueles cromos com bonequinhos de há muitos anos que diziam “amor é...”, e depois uma variedade imensa de exemplos. Qual é a fórmula, não a mágica, mas mais assim a composição química? Ou será a morfologia mais relevante, importando definir primeiro se é animal se é vegetal?

Amor é... bicho ou semente? Destruição ou construção? Altruísmo ou egoísmo? Felicidade ou sofrimento? Corpo ou alma? Química ou física? Ou tudo junto, numa soma impossível de opostos e contraditórios?

Amor é... uma agonia, como diz Vinícius. Que acrescenta “Vem de noite, vai de dia / É uma alegria / E de repente / Uma vontade de chorar".

É. Também. Uma agonia de perguntas sem resposta, uma agonia de fome que se instala, que dá vontade de tragar o mundo. Uma agonia de procura de momentos perfeitos de cromo para preencher a caderneta. Uma agonia de saber que nunca será realmente perfeito, que nunca se acabará a caderneta. Uma agonia de medo de errar, ou do engano. Uma agonia de medo de perder. Uma agonia de algo estranho que nos cresce por dentro do peito, por debaixo da pele, que não se vê nem se pode arrancar. Uma agonia de não se controlar. Uma agonia de alegria e de vontade de chorar. Uma agonia de não saber que definição lhe dar.

À falta de definição, de entendimento, pergunto-me como saberá alguém com absoluta certeza tê-lo encontrado e como saberá resolver os enigmas, e viver sem ser agoniado.

14 comentários:

1REZ3 disse...

Também agonia de querer e não saber se se deve (ou como se deve) avançar...

CB disse...

Também, Noya. Também...

catwoman disse...

Pois, se calhar amor é... não termos certezas. Beijinhos.

CB disse...

Catwoman,
Sim, talvez seja saber viver sem certezas, ou com as incertezas.
Beijinhos

Paulo Lontro disse...

Não, não há receitas e se as houvesse cada pessoa a faria de forma diferente.
É que amor é Intuição, é deixar correr os sentimentos ao seu ritmo, é apenas ser e sentir.
Quem procura respostas ou razões pode encontrar o que não gosta pois as respostas e as razões vêm de fora e não do único sítio de onde devem vir...
:)

CB disse...

Paulo,
O problema é que há quem não saiba viver nesse fluir de ser e sentir sem também se questionar, duvidar, e na dúvida, temer. Alguém de quem não sei o nome escreveu "Amar é o terror de perder o outro, é o medo do silêncio e do quarto deserto, de tudo o que se pensa sem poder falar, do que se murmura a sós sem ter a quem dizer em voz alta. É preciso sentir esse terror para saber o que é amar." E eu concordo que é TAMBÉM isto, e acho que o que dizes vai ao ncontro na parte do que se pensa e não se pode falar - são ao tais questões que não se podem perguntar, talvez, como dizes, porque as respostas não vêm, nem podem vir, de dentro.
O que me pergunto é se, assim, quem não saiba viver com perguntas sem resposta poderá algum dia, realmente, amar.

Paulo Lontro disse...

Entendi o teu ponto de vista e compreendo-o.
Sabes, a dor é o que se sente após um acontecimento traumático, a dor é inevitável.
O sofrimento é o que se sente quando não se consegue “arrumar” a dor, quando se vive constantemente com ela, o sofrimento é uma escolha, é evitável.
Eu não quero dizer que a dor se anula, a dor apenas fica no seu lugar, não domina o futuro.
Quando não se vive o presente porque se questiona o futuro, é viver o medo.
Amar não pode ser o terror de nada, muito menos o terror de perder o outro.
A antecipação de um futuro que pode não acontecer anula a vontade de viver e contamina o presente.
O escritor da frase citada, necessita de viver o terror para saber o que é o seu oposto? Pois bem, eu não necessito e acredito que se assim fosse e se isso se aplicasse a tudo na vida esta seria insuportável.
Imagina se assim fosse com o amor por um filho ou pelos pais ou ainda irmãos… seria possível que o amor fosse viável?

CB disse...

Paulo,
Também compreendo o teu ponto de vista, e de certa forma, em parte, também respondes ao post que estou prestes a publicar (coisas...). Mas essa é talvez "a" questão que mais me atormenta. Se não consigo evitar os sentimentos de "terror", quererá isso dizer que não sou capaz de amar? No exemplo de um filho, eu amo o meu e não é por ter terrores. Mas tenho-os, também por ele, e acho que os tenho porque o amo. É verdade, porém, que vivo hoje em dia muito melhor com esses medos, talvez mais arrumados, perspectivados. Mas levou-me 4 anos a chegar lá... :)

Paulo Lontro disse...

"quererá isso dizer que não sou capaz de amar?"

Diz tu, o que achas?
Achas-te capaz de amar?

:)

CB disse...

Paulo,
That's the million dollar question... Acho que não sei amar na definição que encontro em alguns, e não sabendo qual a definição correcta, não sei se o que sou capaz de sentir, que até hoje inclui terrores, será realmente amor. Mas sei que amo o meu filho, apesar das agonias do medo. Terei provavelmente de chegar a uma definição só minha.
:)

Paulo Lontro disse...

Deixa as definições que lês, pensa apenas na tua definição.
Ou vais dizer que tens dúvida da definição que utilizas para amar o teu filho?
Por acaso, para esse amor, foste ao dicionário?
E quem define qual é a definição correcta ou incorrecta?
Porque não segues confiante com o teu instinto e intuição?
Pensa como queres sentir o amor, o teu amor, essa é a definição correcta!
:)

CB disse...

Paulo,
Acho que sim, que tens razão. A definição tem de ser minha. Agora o busílis é definir, para não usar o nome do "Amor" em vão... :)
O meu instinto anda um bocado avariado e a minha veia científica implica que se farta com a intuição. Por isso me baralho tanto, talvez. Mas lá chegarei.
:)

fd disse...

Excelente definição.

Li algures que a vantagem de se poder escrever sobre o que ninguém conhece na totalidade é que podermos dizer o que quisermos que é sempre adequado. Deixo-te outra definição mais singela, que não é da minha autoria, e que se confunde com paixão: um estado transcendente que engloba a preocupação e desejo de bem-estar do outro, às vezes abdicando de si próprio; o entusiasmo; a necessidade de partilha; a noção que não existe pessoa mais apropriada a nós.

CB disse...

fd,
Tens toda a razão: nisto ninguém detém a verdade universal. A definição que citas também me parece bem. Mas é sempre "também", parece que nenhuma esgota por completo o conceito, há sempre mais qualquer coisa...