Partida

As coisas que tenho e me vestem, me adornam, também são parte do que sou. Vão em malas a encher o carro, para que me possa transportar. Carrego comigo para férias o que sou e o que visto, tal como o que sinto e o que penso. De repente apetecia-me reduzir tudo ao mínimo, ao essencial, e viajar deixando quase tudo na gaveta. Apetecia-me chegar ao meu destino de férias e não me reconhecer no espelho, ou melhor, nem me ver no espelho. Apetecia-me deixar as roupas, as pulseiras, os sapatos, tudo guardado nas gavetas e armários. Mas por mais que me dispa de roupas e adornos, não posso deixar nas gavetas o que está guardado em mim. E carrego comigo também o que queria deixar, e assim deixo mais gavetas vazias do que precisava, porque assim me escondo mais. E quando olhar para o espelho verei o exterior que me define e oculta o interior que me extingue.

Estou presa ao que não quero sentir, ao que não quero pensar, ao que não quero ser. Estou presa e quero partir. Não tenho asas e quero voar. Tenho memória e quero esquecer. Sei que tenho de desistir, mas não deixo de acreditar. Sei que tenho de viver, mas continuo a esperar. Sei contar os dias, os meses, mas ainda não deixei o tempo fechar. Zango-me com tudo e comigo própria, não entendo, mas não me liberto. Quero fugir disto e de mim, mas não sei como. Já tentei parar, já tentei fingir que não sei, à espera que o tempo se encarregue de diluir no vácuo o que não me pertence mas me domina. Já tomei resoluções, já me impus penitências. Já me desculpei e recompensei. Mas acabo de volta ao inevitável de sentir que não me livrei, ainda me corre nas veias, ainda me aperta o peito, me consome, me entristece, me acorda e me adormece.

Os quilómetros da distância que vou percorrer não me levam para longe, não me levam de mim. Mas talvez o tempo que vou viver de outra maneira me possa ajudar e reecontrar uma forma de viver com isto em paz. Já que não posso expulsar, talvez consiga empurrar tudo isto para um cantinho mais escuro, arrumar muito arrumadinho, e aprender a viver sem o peso de o carregar comigo a cada passo, cada quilómetro, cada minuto do tempo que se desfia à minha frente, que devoro na ânsia de que acabe.

Boas férias para mim. Era bom serem férias de mim.

8 comentários:

Ana GG disse...

Princesa, boas férias para ti...contigo e não de ti!

1REZ3 disse...

Boas férias!
E vê se trazes essa cabecinha e o coração leves e frescos :)

LBJ disse...

Boas férias :)

Beijos

Paulo Lontro disse...

Talvez nunca seja possível fazeres férias de ti. Poderás no entanto fazer férias diferentes, contigo.
ou não...?

Pulha Garcia disse...

Boas férias.

PS- Traz-me qualquer coisa
(em ouro de preferência...mas o resto podes escolher tu)

Andreia disse...

Por vezes é mesmo forçado e temos de tirar mesmo férias... de nós! *

CB disse...

Obrigada a todos pelos votos de boas férias, agora prestes a chegar ao fim. A voltar a página.

PS: Pulha -só um Sacana mesmo para pedir um "recuerdo" em ouro! Não te fazia homem de "souvenires", mas pronto, lá irei arranjar um condigno...

CB disse...

PS 2 - Andreia, bem vinda. :)